Ela estava sorrindo, não era um sorriso de verdade, era só mais um daqueles sorrisos frios e sem emoção que ela fingia para evitar as perguntas diárias que andava recebendo sobre seu estado emocional. Mas ela sorria. Sorria enquanto lembrava de tudo aquilo que ela sabia que devia esquecer, enquanto revivia em suas memórias tudo o que ela sabia que devia deixar pra trás. Eram só memórias agora vazias e partidas, que voltavam a saltar em sua mente de repente quando ela estava despreparada. Ela amou quem não devia amar e agora tentava remendar o que restara do seu coração.
Ele mexia com ela de um jeito que ninguém nunca poderá entender. Mexia, mexe, mexeu, não sabia mais que tempo usar na frase sobre o ex-amor que ainda a assombrava.
As lagrimas escorriam de seus olhos verdes enquanto o pseudo-sorriso desaparecia de sua boca. Todos notavam a diferença nela, ela nunca se arrumara tanto quanto agora, enquanto todos achavam que isso era um sinal de que ela havia o superado ela sabia que na verdade era só ela tentando parecer inteira por fora para que ninguém notasse quão quebrada ela estava por dentro.
Ela ultimamente não vivia, sobrevivia. Respirava, e isso quando ele não a roubava o ar. Não comia, se alimentava da falta que sentia dele, ou a falta se alimentava dela, isso ninguém nunca irá saber. Ela fechava os olhos e tentava fingir que tudo não passava de um sonho, que as palavras que antigamente a faziam sorrir nunca tinham existido, afinal, era melhor assim, ela sabia.
Doía muito nela, mas ela fingia que não quando pela manha vestia o seu melhor sorriso e escondia a olheira e os olhos fundos com maquiagem. Ela era forte, segurava o choro quando o via pra só chorar em horas como essa, sozinha. Era como se nem ela estivesse ali, era como se cada memória tivesse vida própria e saltasse em sua cabeça. Ela continuava a chorar, agora em um ritmo forte e descompassado, queria ligar pra ele e perguntar o que havia acontecido com as antigas promessas. Tinham todas ido esgoto a baixo? Mais memórias, hoje era dia 17.
Que bosta de dia 17, ela eliminaria todos eles do calendário se isso fosse resolver, mas nada resolveria.
Ela chora, chora como se isso fosse resolver o problema enquanto se pergunta se dentro dela há um estoque infinito de lagrimas, porque antigamente ela acharia que uma pessoa se desidrataria após chorar tanto assim. Pensa na piada que ele faria sobre essa constatação boba e volta a chorar. Chora como se o mundo fosse acabar.
Ela pega o celular e começa a o escrever uma mensagem. Escreve mas desiste de enviar. Ao invés disso o liga. Será que ele iria a atender? O telefone chamava, ele tava demorando pra atender, ela estava pensando em desistir. Ele atende.
-Alô
(Ela respira fundo ao ouvir a voz dele, imagina se ele está feliz sem ela, se já a esqueceu completamente, daí ela se lembra que ele não tinha nada para esquecer, nunca a amou. Ela volta a chorar.)
-Se é pra me ligar só pra chorar ou pra me xingar não ligue, já te disse isso.
-Oi – foi o que ela disse, a primeira coisa sã que surgiu na cabeça dela. Ela falou oi enquanto queria dizer “oi meu amor, lembra de mim, da sua linda?” ou “oi, sou aquela menina que há alguns dias atrás você chamava de amor, lembra?”, mas só disse oi, ela sabia que provavelmente mais tarde se arrependeria de ter feito essa ligação. Ele escutou e ficou em silêncio, enquanto ela se perguntava sobre porque ligava pra ele se isso era só cutucar a ferida do quase amor deles que parecia que nunca cicatrizaria mais. Então antes que ela desligasse pra voltar a chorar ele resolveu responder.
-Oi, quanto tempo. Tudo bem? – mas ela mal o ouvia, tinha muito barulho. Ele provavelmente estava em uma festa por aí. Já nem lembrava mais dela, não é?
-Sim, faz tempo mesmo. Desculpa te ligar assim, só que hoje é dia 17 e eu não consegui evitar lembrar de você – não que ela não lembrasse todos os outros dias do mês, mas ele não precisava saber disso- eu não estou conseguindo seguir adiante que nem você, na verdade nem consigo imaginar como você fez isso, o que fez com nosso amor? Eu me doei inteira a você, por que você não se deu de volta?
– Isso é uma cobrança?
– Talvez seja sim, talvez eu tenha ligado na esperança de que eu ainda tenha direito de cobrar você. Na esperança que você ainda seja tão meu quanto eu sou sua. – ela volta a chorar – to completamente perdida.
– Perdida, onde?
– Dentro de mim, tá tudo uma confusão por aqui, sabe. Você me deixou uma bagunça. Está o tempo todo na minha cabeça, no meu coração, não sei mais o que eu faço. Eu quero você de volta pra mim.
– Você sabe que isso não vai acontecer, minha pequena.
– É talvez, talvez eu deva só virar a pagina e superar isso, né? Ou melhor, jogar o livro fora e começar a escrever uma outra história, não é? Mas é tanto amor, tanta dor, tá uma confusão dentro de mim.
– Você já disse isso. Onde você quer chegar?
– Eu só precisava te dizer tudo isso, não queria morrer com tudo isso preso dentro de mim. Precisava vomitar esses sentimentos. Precisava falar de nós. – Se bem que por dentro ultimamente ela já estava morta. Ela não vivia, (res)pirava sem ele por perto. Ela havia parado de fazer tudo o que gostava, porque parecia que tudo a lembrava dele, e tudo o que ela mais precisava agora era o esquecer.
Ela desaba em lagrimas.
– Não há mais um nós – ele fala de um jeito mais pra si mesmo do que pra ela.
– Não fala assim –ela reclama.
– Não dá mais, você sabe tanto quanto eu. A gente nunca ia dar certo.
É, chegou o momento que ela imaginara antes, o que ela ia se arrepender de ter ligado.
– Você não é mais o meu amor. Eu sou feliz sem você. Te falo tudo o que você quiser se isso for o que você precisa pra seguir em frente. Ficou mais fácil agora?
Ela nem consegue mais falar no meio de tanto choro.
– Me esquecer é o melhor que você faz, eu errei, você errou. Não dá mais pra seguir assim, a gente só faz merda meu.
– É, mas a maior merda é a que a gente está fazendo agora: desistir um do outro – é tudo o que ela consegue falar por entre as lagrimas.
– A gente tem que desistir, ou melhor: você tem. Eu já desisti. Nós dois juntos não damos certo. A gente tem amor, mas isso não é tudo, não estava certo.
– Podemos até não ser certos, mas somos nós.
– Não, já te disse, não há nenhum nós, só há um eu e um você. Independentes. Melhor pararmos de nos falar. Para de se torturar, para de me torturar. Você fazendo isso só trás de volta a dor e nos faz chorar.
– Não..
– É melhor assim. Pra nós dois. A gente tem que se afastar pra superar.
– Você pensa em mim todos os dias 17?
– Penso em você todos os dias.Sempre. Se cuida.
– Então tchau. Tenho mesmo que aprender a viver sem ti. Adeus.
– Pensa em mim também? Sinto sua falta minha linda.
– Eu amo você. Não quero viver sem ti, mas vou.
É o fim da ligação, o fim da relação, o fim do nós, o fim das tentativas dela. Mas é só mais um dia 17, pro amor dos dois.